Relator acolhe tese do “in dubio pro sufragio” e afasta entendimento do TRE-RO; decisão não devolve, por ora, a cadeira ao ex-vereador Marcelo Belgamazzi
Porto Velho, RO – O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) reformou, em 22 de setembro de 2025, o acórdão do Tribunal Regional Eleitoral de Rondônia (TRE-RO) que havia reconhecido fraude à cota de gênero no Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (DRAP) do Podemos nas eleições municipais de 2024 em Rolim de Moura (RO). No Agravo em Recurso Especial Eleitoral nº 0600401-02.2024.6.22.0029 (PJe), o relator, ministro André Mendonça, deu provimento ao agravo para destrancar o Recurso Especial e, desde logo, conheceu e deu provimento ao apelo, restabelecendo a sentença de improcedência proferida em primeiro grau. O julgamento ocorreu de forma monocrática.
O caso teve início com Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) proposta pelo Ministério Público Eleitoral (MPE) e por candidato adversário, que apontavam suposta utilização de candidaturas fictícias femininas pelo Podemos para atingir o percentual mínimo de 30% previsto no art. 10, §3º, da Lei nº 9.504/1997. Em primeiro grau, os pedidos foram julgados improcedentes. Em apelação, o TRE-RO, por maioria, deu provimento para reconhecer a fraude, cassar o DRAP e atingir os diplomas vinculados, além de declarar inelegibilidade das candidatas Ana Caroline Cardoso de Azevedo e Lucilene Dias pelo prazo de oito anos. Contra esse acórdão, foram opostos embargos de declaração, rejeitados, e posteriormente interposto Recurso Especial Eleitoral pelos recorrentes Marcelo Henrique Belgamazzi, Ana Caroline e Lucilene, representados por defesa que incluiu o advogado eleitoralista Nelson Canedo Motta.
Paralelamente, foi interposto agravo para superar a inadmissão do Recurso Especial na origem.

Ao apreciar o agravo, o TSE superou o óbice de admissibilidade (Súmula nº 24/TSE) por entender que o enquadramento jurídico dos fatos constantes do acórdão regional comportava revaloração sem revolvimento probatório. Na sequência, ao adentrar o mérito do Recurso Especial, o ministro André Mendonça consignou que a própria moldura fática assentada no TRE-RO evidenciava “dúvida razoável” sobre a perpetração da alegada fraude, incidindo a Súmula nº 30/TSE e o primado do in dubio pro sufragio. Entre os pontos destacados pelo relator, constaram:
— Exíguo tempo de campanha de Lucilene Dias, lançada em 16/09/2024 em substituição a candidata indeferida, concorrendo sub judice e com apenas 21 dias até a votação;
— Alegação, documentada em escritura pública e depoimento, de desistência tácita de Ana Caroline por motivos pessoais ligados à pauta que defendia, somada ao fato de não ter votado em si mesma;
— Existência de atos de campanha reconhecidos na sentença e mencionados no acórdão (distribuição de santinhos, veiculação de spot em rádio, reuniões e adesivagem de veículos), ainda que sem intensa presença em redes sociais;
— Prestação de contas com alguma movimentação financeira — valores modestos (R$ 398,00 e R$ 748,00, oriundos de material cedido por partido aliado no pleito majoritário) —, o que afasta quadro de contas “zeradas”.
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O relator ponderou que, embora os elementos objetivos do enunciado da Súmula nº 73/TSE (votação inexpressiva, ausência de atos efetivos de campanha e movimentação financeira irrelevante) possam, em tese, indicar fraude, eles devem ser lidos “a partir dos fatos e das circunstâncias do caso concreto”. No processo, a combinação de curto período de campanha, registro sub judice, desistência qualificada e atos eleitorais efetivamente praticados, ainda que de baixa escala, não estabeleceu o “juízo de certeza” exigido para desconstituir a vontade do eleitorado. Nessa linha, o TSE reputou aplicável a jurisprudência que privilegia a preservação do sufrágio diante de dúvida razoável e restabeleceu a improcedência reconhecida na origem.

A decisão também rechaçou alegações de negativa de prestação jurisdicional, mantendo as conclusões do TRE-RO quanto a temas processuais (apensamento de feitos e litispendência) sob o prisma de inexistência de prejuízo processual e análise já realizada nos embargos. No ponto, o relator rememorou precedente do STF (ADI 5507) sobre a racionalidade da reunião de ações à luz da conveniência processual e da ampla defesa.
Apesar da vitória processual dos recorrentes no tema do Podemos, o retorno imediato de Marcelo Henrique Belgamazzi ao mandato não se verifica. Isto porque, conforme registrado no histórico do caso, há decisão autônoma que anulou votos do Partido da Mulher Brasileira (PMB) por suposta fraude à cota de gênero em outro processo, com recontagem que deslocou a vaga para o PL. Somente eventual desfecho favorável no processo referente ao PMB poderia, em tese, reabrir a via para recomposição da cadeira.
O processo tramita sob o número 0600401-02.2024.6.22.0029, classe Recurso Especial Eleitoral, com partes recorrentes Marcelo Henrique Belgamazzi, Ana Caroline Cardoso de Azevedo e Lucilene Dias, e recorridos Jonas Kuhn e Ministério Público Eleitoral. Consta nos autos a atuação de diversos patronos, entre eles Nelson Canedo Motta (OAB/RO 2.721), cuja peça recursal especial enfrentou tanto a tese material de fraude quanto os temas processuais correlatos, e foi tomada como base para o exame de mérito após o provimento do agravo.
Com a reforma do acórdão regional e o restabelecimento da sentença absolutória, o TSE afasta, por ora, a pecha de fraude à cota de gênero atribuída ao DRAP do Podemos em Rolim de Moura. O efeito prático imediato recai sobre o reconhecimento da inexistência de fraude no caso concreto analisado; já a ocupação do mandato vincula-se ao resultado de processo distinto que envolveu outra legenda, permanecendo inalterada até deliberação específica naquela ação.
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