No podcast, Roberto Sobrinho, Vinícius Miguel, Carolina Zemuner e Samuel Costa analisam o descrédito dos partidos, o uso político da fé, as contradições do Estado mínimo e os rumos do campo progressista em Rondônia
Porto Velho, RO – O episódio do podcast Põe Na Bancada abordou a “realidade política do Brasil” e, em seguida, “a realidade política do estado de Rondônia”, segundo apresentação do mediador Roberto Sobrinho. O programa discutiu pesquisas que apontam “uma avaliação muito mal” da população sobre “a atuação do Congresso Nacional e dos partidos políticos” e relacionou esse quadro a um “cansaço” com os representantes. Participaram como convidados Vinícius Miguel, professor licenciado da Universidade Federal de Rondônia e secretário municipal em Porto Velho; Carolina Zemuner, advogada e conselheira da OAB; e Samuel Costa, advogado. Conforme o mediador, Miguel preside o PSB em Rondônia, enquanto Carolina e Samuel atuam como porta-vozes da Rede Sustentabilidade.
Na abertura, Roberto Sobrinho citou que a percepção negativa “coloca em xeque a democracia e permite que aventureiros autoritários também apareçam”. A partir desse eixo, os convidados trataram de participação social, funcionamento dos partidos e fragmentação do debate no Parlamento. “A gente precisa constantemente reinventar as formas de participação”, afirmou Vinícius Miguel, ao avaliar “desgastes” do modelo de democracia reduzido a “escolha periódica de representantes”. Ele citou “pequenas corporações” no Legislativo e apontou “crise dos partidos políticos”, mencionando mudanças de nomes e ausência de eleições internas: “São poucos os partidos que fazem eleições periódicas para suas lideranças”.
Carolina Zemuner avaliou os partidos como “nichos de poder”, relacionando representatividade a acesso a recursos eleitorais. “A gente costuma brincar que não é uma brincadeira, é real, que cada eleitor tem um preço”, disse, ao comentar a divisão do fundo partidário e a consequência de “representatividades fictícias”. Ela citou “a quantidade de mulheres” e “a população preta” como exemplos de sub-representação.
Questionado sobre a ideia de que “políticos só legislam em causa própria”, Samuel Costa vinculou o fenômeno a uma “metamorfose” histórica e mencionou a substituição de candidatos inelegíveis por familiares. Ele também relacionou votações recentes à distância entre Congresso e “vontade do povo”, mencionando a discussão sobre imposto de renda e a tributação de “super ricos”: “No Norte do Brasil cerca de 91% vão ser beneficiados, no Nordeste quase 95%”. Ao comentar a atuação parlamentar, afirmou que parte do eleitorado valoriza “o emendeiro” em detrimento das funções de “fiscalizar e legislar”.
O uso político da fé foi apontado como componente relevante na escolha de candidatos. Para Carolina Zemuner, a política “mimetiza a religião”, com impacto de slogans como “Deus, Pátria, Família”. Segundo ela, discursos religiosos simplificados “visam um ideal religioso, mas que estão longe da realidade das pessoas”. Samuel Costa acrescentou que propostas “simplificadoras” têm apelo, citando, como exemplo, a defesa de pena de morte. Em complemento, Vinícius Miguel afirmou que o “funcionamento de pensamento” pode ser “muito binário”, o que facilita respostas “muito diretas, muito objetivas” sem exigir “reflexão”.
No segundo bloco, o programa pediu que os participantes conceituassem “esquerda” e “direita”. Vinícius Miguel apresentou uma síntese “didática” baseada em categorias clássicas, associando a direita a “menos Estado” e “primazia da liberdade”, e a esquerda a “mais Estado” e “primazia da igualdade”. Ele ponderou, contudo, que “essas categorias hoje são absolutamente complexas”, com contradições em temas de costumes e políticas públicas. Samuel Costa retomou referências históricas e simbólicas e afirmou que “pauta moral” não resolve problemas materiais: “Pauta moral […] não enche a barriga de ninguém”.
Ao discutir o “Estado mínimo”, Roberto Sobrinho perguntou sobre efeitos em saúde e educação. Carolina Zemuner respondeu que “não tem Bolsa Família, não tem pé de meia, não tem SUS”, e que “o estado mínimo é o estado, ele atua minimamente”. Em sequência, Vinícius Miguel apontou contradições: “Esse estado nunca se torna mínimo […] no recrudescimento do uso da violência estatal contra pobres” e nas “isenções fiscais para grandes bancos” e setores econômicos.
O episódio também registrou debate sobre entregas de políticas públicas e comportamento eleitoral em Porto Velho. Roberto Sobrinho relatou que, à época da eleição municipal, pesquisas indicavam apoio feminino de baixa renda a uma candidatura e que, “quando eles mostraram […] as entregas do governo federal”, houve migração para outro candidato “para enfrentar” a adversária. “As entregas têm um peso”, resumiu. Ainda no plano local, Carolina Zemuner citou pesquisa sobre rejeição a candidatas mulheres e mencionou dados de violência de gênero: “É a cidade que proporcionalmente mais mata mulheres no Brasil”, disse, ao tratar de contexto social e voto feminino.
No terceiro bloco, os convidados analisaram a relação entre religião e política e as mensagens veiculadas por lideranças religiosas. “Usar a fé para alcançar um propósito político, econômico, eleitoral, é absolutamente danoso”, afirmou Vinícius Miguel, recordando “Dai a César o que é de César” e episódio bíblico sobre “vendilhões do templo”. Para Carolina Zemuner, trata-se de “estelionato religioso”: “Usar desse espaço sagrado para pulverizar o ódio […] é profanar um espaço que é sagrado”. Samuel Costa disse que “tolerar, respeitar o outro é uma obrigação” e criticou discursos de “ódio” e “intolerância”.
Nos minutos finais, os participantes comentaram estratégias para o campo progressista em Rondônia. Samuel Costa disse considerar “condição sine qua non” a liderança de Confúcio Moura e defendeu “ampliar as vagas para deputado estadual”, “reconduzir” representação federal e “garantir a vaga de senador”. Carolina Zemuner apontou pautas como “sustentabilidade”, “demarcação das terras indígenas”, “fim do feminicídio”, “inclusão das minorias” e “mandatos participativos”, além de “mais pragmatismo”. Vinícius Miguel mencionou “fragilização” partidária e “ausência de renovação de quadros” e defendeu “profissionalizar muito as campanhas” e praticar “crítica e autocrítica”.
Ao encerrar, Roberto Sobrinho retomou o fio condutor do episódio: “um momento de transição da democracia” visto “de uma forma de desesperança”, a crítica a representantes que, “depois” de eleitos, “votam de acordo com os seus interesses” e a perspectiva de novos debates sobre organização política e efeitos de investimentos federais em Rondônia.
FRASES DO PÕE NA MESA

ROBERTO SOBRINHO
01) “Isso coloca em xeque a democracia e permite que aventureiros autoritários também apareçam.”
Afirmou ao comentar pesquisas que mostravam a insatisfação popular com o Congresso e os partidos políticos.
02) “Se você vai lá num altar… e diz o seguinte: ‘eu estou orando para a morte do presidente Lula’. Isso é algo cristão?”
Questionou ao introduzir o debate sobre o uso político da fé e discursos de ódio em espaços religiosos.
03) “Eu quero dizer o seguinte, que esse campo da ultradireita não trouxe obras para o estado de Rondônia.”
Disse ao comparar a atuação de governos de direita com a ausência de entregas estruturais no estado.
04) “Pois é, o Bolsonaro veio aqui… ele não fez entregas para Porto Velho.”
Pontuou ao citar o ex-presidente como exemplo da falta de resultados concretos para a capital rondoniense.
05) “As entregas têm um peso.”
Resumiu ao analisar como programas sociais e obras públicas influenciam o comportamento eleitoral.

AS ÚLTIMAS OPINIÕES
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VINÍCIUS MIGUEL
01) “A gente precisa constantemente reinventar as formas de participação.”
Declarou ao diagnosticar a crise de representatividade e os limites da democracia baseada apenas em eleições.
02) “São poucos os partidos que fazem eleições periódicas para suas lideranças.”
Observou ao criticar a estrutura interna das siglas e a falta de democracia partidária.
03) “Os partidos não querem se chamar de partidos.”
Comentou ao mencionar a tentativa de várias legendas de disfarçar suas identidades políticas por meio de novas nomenclaturas.
04) “A gente não tem sequer esses chavões… esses adestramentos típicos do nazifascismo de ‘senta, cumprimenta, dá a pata’.”
Pontuou ao fazer uma autocrítica ao campo progressista por não conseguir oferecer respostas diretas e acessíveis à população.
05) “Esse estado nunca se torna mínimo… no recrudescimento do uso da violência estatal contra pobres.”
Disse ao denunciar a contradição de um Estado que reduz políticas sociais, mas mantém aparato repressivo e privilégios fiscais.

CAROLINA ZEMUNER
01) “Os partidos… se tornaram nichos de poder.”
Afirmou ao abordar a concentração de decisões e recursos dentro das estruturas partidárias.
02) “A gente costuma brincar que não é uma brincadeira, é real, que cada eleitor tem um preço.”
Disse ao criticar a mercantilização do voto e o uso do fundo partidário como ferramenta de poder.
03) “A política mimetiza a religião… ‘Deus, Pátria, Família’ elegeu Bolsonaro com 70% dos votos aqui.”
Pontuou ao analisar a força de slogans religiosos e o apelo moral nas campanhas eleitorais.
04) “Usar desse espaço sagrado para pulverizar o ódio… é profanar… É um estelionato religioso.”
Afirmou ao condenar líderes religiosos que utilizam templos para propagar intolerância política.
05) “Uma pesquisa do MDB… mostrou… ‘80% das mulheres… disseram que não votariam em mulher’.”
Relatou ao discutir o impacto do machismo e da violência de gênero no voto feminino em Rondônia.

SAMUEL COSTA
01) “Pauta moral… não enche a barriga de ninguém.”
Disse ao comparar o discurso conservador com a ausência de políticas que atendam às necessidades básicas da população.
02) “Tem camarada aí que pega a Caixa 2… contrata seis mil famílias a quinhentos reais na última semana de eleição.”
Exclamou ao denunciar práticas de compra de votos e manipulação de eleitores durante campanhas.
03) “Essa pessoa pode ser qualquer coisa, menos cristã de verdade.”
Afirmou ao criticar líderes religiosos que pregam ódio e intolerância sob o discurso da fé.
04) “Tem uma teoria diabólica, neopentecostal, que é a tal da teoria da prosperidade.”
Pontuou ao rejeitar a teologia da prosperidade e seu uso político e econômico.
05) “O Confúcio Moura é o nosso Pelé. Ele tem que liderar isso.”
Declarou ao defender a centralidade do senador Confúcio Moura na reorganização do campo progressista rondoniense.