Sentença reconhece que a conduta atribuída não configurava crime à época dos fatos, ocorridos em fevereiro de 2023
Porto Velho, RO – A Vara da Auditoria Militar e Cartas Precatórias Cíveis e Criminais do Tribunal de Justiça de Rondônia (TJRO) absolveu uma bombeira militar acusada de corrupção passiva, ao entender que o ato descrito na denúncia não constituía crime à época dos fatos. A decisão, assinada pelo juiz Carlos Augusto Teles de Negreiros em 17 de outubro de 2025, julgou improcedente a ação penal movida pelo Ministério Público do Estado de Rondônia (MPRO) e reconheceu a atipicidade absoluta da conduta.
De acordo com o processo, o caso teve início em fevereiro de 2023, quando a bombeira teria solicitado R$ 2 mil ao organizador do evento “Carnafolia – Bloco Onlyfans”, em Buritis (RO), com a promessa de auxiliar na execução de um projeto contra incêndio e pânico e facilitar sua aprovação junto à Seção de Atividades Técnicas do Corpo de Bombeiros. O empresário afirmou ter recebido mensagens em que a servidora pedia que o assunto “ficasse só entre nós”.
O Ministério Público denunciou a militar com base no artigo 308 do Código Penal Militar (corrupção passiva), sustentando que ela teria solicitado vantagem indevida em razão da função pública. O caso foi instruído com inquérito policial militar e teve a oitiva de testemunhas e da própria acusada.
Durante a instrução processual, foram ouvidas testemunhas por videoconferência, e tanto o Ministério Público quanto a defesa apresentaram manifestações finais. O promotor de Justiça Mauro Adilson Tomal, autor da denúncia, reconheceu que não havia provas suficientes para condenação, citando contradições entre os depoimentos colhidos na fase extrajudicial e aqueles prestados em juízo. Também destacou a inexistência de comprovação inequívoca da suposta solicitação de valores e o fato de que a bombeira não possuía atribuições funcionais para interferir nas vistorias, já que o projeto técnico do evento encontrava-se aprovado.
A defesa reiterou que não houve qualquer recebimento ou promessa comprovada de vantagem indevida. As advogadas sustentaram que a acusada não integrava a Seção de Atividades Técnicas e, portanto, não tinha poder para liberar vistorias ou alvarás. Além disso, lembraram que tanto o inquérito policial militar quanto o processo administrativo disciplinar concluíram pela inexistência de irregularidades.
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Ao analisar o caso, o juiz Carlos Augusto Teles de Negreiros observou que, em fevereiro de 2023, quando os fatos teriam ocorrido, o artigo 308 do Código Penal Militar não incluía a conduta de “solicitar” vantagem indevida como crime — apenas “receber” ou “aceitar promessa”. Essa alteração legislativa ocorreu posteriormente, com a entrada em vigor da Lei nº 14.688/2023, sancionada em setembro daquele ano, que também aumentou a pena máxima de oito para doze anos de reclusão.
O magistrado concluiu que a aplicação da nova lei seria indevida, por se tratar de “novatio legis in pejus” — uma lei posterior mais gravosa, que não pode retroagir para prejudicar o réu. “À época dos fatos, o núcleo típico ‘solicitar’ não integrava o artigo 308 do Código Penal Militar, razão pela qual a conduta imputada na denúncia era atípica”, registrou o juiz.
Com base nesse entendimento, a Justiça Militar julgou improcedente a ação penal e absolveu a bombeira, fundamentando-se no artigo 439, alínea “b”, do Código de Processo Penal Militar, que prevê absolvição quando o fato não constitui infração penal.
A sentença também determinou a intimação da bombeira para ciência da decisão. A empresário foi intimado apenas quanto ao dispositivo da sentença. Após o trânsito em julgado, o juiz determinou a comunicação da decisão à Corregedoria-Geral do Corpo de Bombeiros Militar de Rondônia e ao Instituto de Identificação Civil e Criminal (IICC).
Com isso, o processo nº 7009124-93.2023.8.22.0000 foi arquivado, ficando reconhecida a absolvição definitiva da militar por ausência de tipificação penal à época dos fatos.