Pecuaristas apontam entraves fundiários, burlas no rastreamento e dificuldades técnicas para cumprimento da promessa ambiental da maior empresa de carne do mundo
Porto Velho, RO – Em estados da Amazônia Legal como Rondônia e Pará, produtores rurais que abastecem a cadeia da carne bovina expressaram descrença quanto à possibilidade de a JBS atingir a meta de banir o desmatamento em suas operações na região até o fim de 2025. A avaliação foi colhida em entrevistas com dezenas de atores do setor, incluindo lideranças sindicais e donos de propriedades de criação de gado.
A proposta da JBS, anunciada publicamente, envolve o rastreamento completo dos animais comprados, de modo a garantir que não tenham origem em áreas desmatadas ilegalmente. A empresa afirma que vem investindo em ferramentas digitais, como plataformas com tecnologia blockchain e monitoramento por inteligência artificial, para alcançar esse objetivo.
Em Rondônia, a percepção de que o plano não será executado a tempo é recorrente. Um dos entrevistados resumiu a situação afirmando que “é impossível dizer que toda a carne será livre de desmatamento”.
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A presidente da Comissão de Mulheres do Agronegócio, Cristina Malcher, destacou o impacto da insegurança fundiária no processo de regularização ambiental. “Se você não sabe quem é o dono da terra, não tem como fazer regularização ambiental”, declarou à reportagem.
A JBS respondeu às críticas afirmando que a amostra abordada na investigação — cerca de 30 pecuaristas — não representa o universo de mais de 40 mil fornecedores ativos. Segundo a empresa, o compromisso com práticas sustentáveis está mantido, mas envolve desafios que extrapolam a atuação de uma única corporação.
No estado do Pará, a JBS atua em parceria com o governo estadual em um projeto piloto de rastreamento do rebanho por meio de brincos eletrônicos. A meta é monitorar aproximadamente 26 milhões de cabeças de gado até 2026. O governador Helder Barbalho reconheceu entraves, principalmente entre os pequenos produtores. Ele informou que o Fundo Bezos aportou R$ 143 milhões no projeto.
Por outro lado, representantes do setor agropecuário relataram que não receberam instruções detalhadas sobre o funcionamento do novo sistema, nem suporte técnico adequado para sua implementação. Segundo Ticão, liderança sindical do sudeste do Pará, “nem eles sabem como essa rastreabilidade será feita”.
A reportagem também aponta que, mesmo com avanços tecnológicos, ainda existem brechas que permitem a comercialização de carne bovina fora do circuito controlado. Uma das falhas identificadas é o abate de animais em regiões não cobertas pelo sistema de monitoramento, dificultando a verificação da origem da carne.
Com o prazo de 2025 se aproximando, o cenário retratado pelos produtores de Rondônia indica que alcançar a meta da JBS demandará superação de entraves estruturais e mudanças profundas nos mecanismos de controle da cadeia da carne na Amazônia.