EDITORIAL
Pornografia e saúde mental: evidências científicas apontam riscos cognitivos e emocionais

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Estudos recentes e revisões sistemáticas associam consumo excessivo a alterações cerebrais, déficits de memória, ansiedade, depressão e impactos nos relacionamentos

Por Informa Rondônia - segunda-feira, 02/06/2025 - 11h38

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Porto Velho, RO – O crescente acesso e consumo de pornografia na era digital têm levantado debates acalorados sobre seus potenciais impactos na sociedade e na saúde individual. Para além das discussões morais, um corpo crescente de evidências científicas, incluindo revisões sistemáticas, meta-análises e estudos de neuroimagem, começa a traçar um panorama preocupante sobre as consequências do consumo excessivo de material pornográfico para a saúde mental e cognitiva dos usuários.

Pesquisas recentes, como as revisões analisadas por Almeida, Santos e Figueiredo (2022) na Revista Brasileira de Sexualidade Humana, apontam para uma associação predominante entre o consumo de pornografia e efeitos psicossexuais negativos. Estes vão desde o aumento de comportamentos sexuais permissivos e de risco até a impessoalidade e objetificação nas relações.

A intensidade desses efeitos, ressaltam os autores, parece depender não apenas da frequência do consumo, mas também da percepção subjetiva e do conflito moral que o indivíduo possa ter em relação a essa prática.

O psicólogo Alejandro Villena, coordenador da Unidade de Sexologia Clínica Dr. Carlos Chiclana em Madri, corrobora essa visão, afirmando em entrevista à Gazeta do Povo (2023) que as consequências são graves e visíveis na prática clínica. “Sem dúvida, tem influência”, declara Villena sobre o impacto da pornografia na saúde mental. Ele cita estudos que “indicam que a pornografia pode aumentar a ansiedade e dificultar a capacidade de regular as emoções”.

Villena relata um aumento na procura por ajuda terapêutica, com pacientes chegando ao consultório quando o consumo já afetou severamente diversas áreas da vida, frequentemente coexistindo com quadros de ansiedade e depressão.

Um dos aspectos mais alarmantes destacados por Villena e ecoado em outras pesquisas é o impacto sobre as funções cognitivas. “Além disso, pode afetar o desempenho cognitivo, o aproveitamento acadêmico, o sono, a capacidade de atenção e memória dos adolescentes”, alerta o psicólogo.

Essa preocupação encontra respaldo no trabalho de Almeida et al. (2022), que menciona a associação do uso problemático de pornografia a “déficits em diferentes funções cognitivas, incluindo atenção, controle inibitório, memória de trabalho e tomada de decisões”, um perfil neuropsicológico considerado congruente com o de outras adições.

O trabalho de conclusão de curso de Maciel (2023), da Unichristus, aprofunda a investigação sobre essas alterações, explorando a neurociência do vício em relação à pornografia. A pesquisa discute como o sistema de recompensa cerebral, mediado pela dopamina, pode ser afetado pelo consumo exagerado, de forma análoga a outras substâncias ou comportamentos viciantes. O estudo reforça a ligação entre o uso problemático e consequências como dificuldades de intimidade, disfunção erétil, problemas de excitação, sentimentos de culpa, vergonha, baixa autoestima e a formação de expectativas sexuais irreais.

A base neurológica para essas preocupações foi investigada em um estudo conduzido por pesquisadores do Instituto Max Planck para o Desenvolvimento Humano em Berlim, publicado na prestigiosa JAMA Psychiatry e noticiado pelo G1 (2014). Utilizando ressonância magnética, os cientistas encontraram uma “importante vínculo negativo entre o ato de ver pornografia durante várias horas por semana e o volume de matéria cinzenta no corpo estriado direito do cérebro”, além de uma redução na atividade do córtex pré-frontal em resposta a estímulos sexuais.

Observaram também uma deterioração nas conexões entre essas duas áreas cerebrais cruciais para recompensa, motivação, comportamento e tomada de decisões. Embora não estabeleçam causalidade direta, os autores do estudo alemão sugerem que os achados indicam “mudanças na plasticidade neuronal resultante de intensa estimulação no centro do prazer”, fornecendo uma base biológica para os efeitos observados na saúde mental e cognitiva.

A pesquisa de Ferreira e Santos (2023), publicada na Intercom: Revista Brasileira de Ciências da Comunicação, adiciona outra camada de complexidade ao analisar a relação pela ótica da teoria de Usos e Gratificações.

Eles destacam que, embora existam relatos de usos percebidos como positivos (como aumento do conhecimento sexual), a literatura predominantemente aponta para efeitos negativos, como níveis mais elevados de depressão, agressividade relacional, menor comunicação e estabilidade nos relacionamentos, e associação com comportamentos de risco.

Em suma, embora a pesquisa sobre os efeitos da pornografia ainda esteja em desenvolvimento e apresente desafios metodológicos, as evidências científicas acumuladas até o momento acendem um sinal de alerta.

Estudos de diferentes áreas convergem ao associar o consumo frequente e problemático de pornografia a uma série de desfechos negativos para a saúde mental, incluindo ansiedade, depressão, dificuldades de relacionamento e, crucialmente, déficits em funções cognitivas essenciais como atenção e memória, possivelmente ligados a alterações estruturais e funcionais no cérebro. A normalização do consumo, como aponta Villena, contrasta com a gravidade das consequências observadas, sublinhando a necessidade de maior conscientização e pesquisa sobre o tema.


Referências Principais:

  • Almeida, P. A., Santos, G. F., & Figueiredo, Z. B. (2022). O impacto da pornografia na sexualidade dos consumidores – Estado da literatura atual. Revista Brasileira de Sexualidade Humana, 33, e1007.
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  • Ferreira, R. M. C., & Santos, M. S. (2023). Dos efeitos à constatação dos usos da pornografia pela audiência. Intercom: Revista Brasileira de Ciências da Comunicação, 46, e2023102.
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  • Luque, L. (Entrevistador) & Villena, A. (Entrevistado). (2023, 27 de junho). “As consequências da pornografia são graves e estamos vendo isso em consultório”. Gazeta do Povo.
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  • Maciel, N. D. S. (2023). Consumo excessivo de pornografia e suas possíveis consequências na vida do usuário [Trabalho de Conclusão de Curso, Centro Universitário Christus]. Repositório Institucional Unichristus.
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  • (2014, 29 de maio). Estudo diz que pornografia pode ser prejudicial ao cérebro. G1 Ciência e Saúde.
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AUTOR: INFORMA RONDÔNIA





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