Informa Rondônia Desktop Informa Rondônia Mobile

EDITORIAL
A encruzilhada de Rondônia: desenvolvimento econômico versus sustentabilidade na visão da indústria

🛠️ Acessibilidade:

Presidente da Fiero, Marcelo Thomé, defende exploração regulada em terras indígenas e cobra regras claras, expondo as complexas tensões entre progresso e preservação na Amazônia rondoniense

Por Informa Rondônia - quarta-feira, 04/06/2025 - 08h57

Conteúdo compartilhado 267 vezes

Porto Velho, RO – Em recente entrevista ao podcast Resenha Política, apresentado por Robson Oliveira, o presidente da Federação das Indústrias do Estado de Rondônia (Fiero), Marcelo Thomé, trouxe à tona um debate espinhoso e fundamental para o futuro da região amazônica: a exploração econômica em terras indígenas. Longe de endossar o status quo, Thomé posicionou-se de forma contundente contra o modelo atual de proibição, argumentando que ele não apenas falha em proteger o meio ambiente, mas também impede o desenvolvimento legal e agrava problemas sociais. Sua fala, detalhada e por vezes provocativa, desenha um panorama onde a busca por crescimento econômico colide frontalmente com a urgência da sustentabilidade, exigindo, segundo ele, uma reavaliação profunda das abordagens vigentes.

A defesa de um novo modelo para as terras indígenas é um dos pontos centrais da argumentação de Thomé. “Não concordo com o modelo atual. Defendo que a gente discuta um novo modelo, com responsabilidade e foco”, afirmou, deixando claro seu descontentamento com a proibição pura e simples. Para o líder industrial, a formalização das atividades econômicas, mesmo que gerem impacto – algo que ele reconhece como inerente a “toda atividade econômica” –, permitiria a mitigação de danos através da tecnologia e, crucialmente, a partilha de riquezas com o Estado e as próprias comunidades locais. Ele cita o Canadá como exemplo, onde povos originários participam economicamente através de empregos ou royalties. A crítica ao modelo atual é severa: “A gente está perdendo riqueza, criando mazelas sociais aos povos originários e enriquecendo muito poucos, destruindo a floresta”. A visão de Thomé sugere que a proibição cega fomenta a ilegalidade e a concentração de renda, sem garantir a preservação ambiental almejada.

Contudo, a posição de Thomé revela nuances e aparentes contradições quando confrontada com outras de suas declarações na mesma entrevista. Ao comentar leis estaduais que visam reduzir áreas protegidas – uma prática que tem ocorrido em Rondônia –, ele não hesita em reconhecer o risco que tais iniciativas representam. “Esse tipo de prática que retarda a equação para um modo produtivo sustentável […] pode restringir o acesso de Rondônia aos melhores mercados”, admitiu. Essa admissão expõe a delicada balança que o estado tenta equilibrar: por um lado, a pressão por desenvolvimento e flexibilização ambiental; por outro, a crescente exigência dos mercados internacionais por garantias de sustentabilidade. A fala do presidente da Fiero, neste ponto, serve como um alerta sobre as consequências econômicas diretas de decisões ambientais controversas.

A necessidade de regras claras e de um ambiente regulatório robusto é outro tema recorrente na fala de Thomé, especialmente no que tange ao mercado de carbono e ao acesso a crédito. Ele critica a lentidão do Brasil em regulamentar o mercado de carbono, defendendo uma agência reguladora independente para evitar distorções. “Sem regra, pode acontecer o absurdo de compensar a emissão de alguém que continua promovendo destruição em outro lugar”, alertou, sublinhando a importância de uma legislação que defina “como o mercado vai funcionar”. No campo financeiro, a mensagem é igualmente direta: a era do crédito fácil para quem possui passivos ambientais ou irregularidades fundiárias acabou. “Quem continuar produzindo em área irregular não vai acessar crédito. Isso é definitivo”, declarou Thomé, indicando que o próprio setor financeiro já impõe barreiras que incentivam a regularização e práticas mais sustentáveis.

Thomé também aborda a questão da infraestrutura, defendendo a controversa concessão da BR-364 à iniciativa privada. Sua justificativa é pragmática: “O Estado brasileiro é incapaz de fazer esse investimento. Nunca fez”. Ele aponta para os R$ 10 bilhões em investimentos previstos no modelo licitado ao longo de 30 anos como uma solução necessária para a logística do estado. Esse ponto se conecta ao panorama da indústria rondoniense que ele apresenta: cerca de 5.700 indústrias ativas, gerando 57 mil empregos diretos e respondendo por 15% a 16% do PIB estadual. Setores como nutrição animal e piscicultura mostram crescimento, com a produção de ração saltando de três para mais de 40 empresas e o peixe local alcançando mais de 90 países. A carne bovina, com um rebanho estimado entre 15 e 16 milhões de cabeças, permanece como o carro-chefe das exportações.

Em meio a esse cenário de desenvolvimento e desafios regulatórios, Thomé não ignora a ameaça crescente das mudanças climáticas. Ele revela um dado alarmante: 16 municípios de Rondônia enfrentaram crise hídrica em 2023. “Quando eu cheguei aqui, era impensável discutir escassez hídrica na Amazônia. Isso já está batendo à nossa porta”, disse, conferindo um tom de urgência à necessidade de adaptação. Como resposta, menciona iniciativas da Fiero, como a articulação via Instituto Amazônia Mais 21 para conectar produtores a financiamentos sustentáveis através da plataforma Facility de Investimentos Sustentáveis, visando oferecer assistência técnica e facilitar o acesso ao crédito, sobretudo para pequenos empreendedores.

Ao final, a visão de Marcelo Thomé, conforme expressa na entrevista, é a de um líder industrial que busca caminhos para conciliar o desenvolvimento econômico de Rondônia com as crescentes demandas por sustentabilidade e as duras realidades das mudanças climáticas. Sua defesa de um debate aberto sobre a exploração econômica em terras indígenas, aliada à cobrança por regras claras e ao reconhecimento dos riscos de práticas ambientais inadequadas, coloca a Fiero – e, por extensão, o setor produtivo do estado – em uma posição complexa. A aposta parece ser na formalização, na tecnologia e na liderança do setor privado para encontrar soluções de longo prazo. “O setor privado precisa liderar uma agenda de enfrentamento à pobreza na Amazônia, consorciado ao Estado, mas com visão de longo prazo”, concluiu. Resta saber se essa visão pragmática, que desafia modelos estabelecidos e reconhece contradições, será capaz de guiar Rondônia por sua intrincada encruzilhada entre o progresso econômico e a preservação ambiental.

AUTOR: INFORMA RONDÔNIA





COMENTÁRIOS: