Dois anos após sua criação, programa contra assédio sexual ainda aguarda implementação efetiva nos municípios
A dimensão do problema
Sete em cada dez mulheres brasileiras já sofreram algum tipo de assédio em espaços públicos ou privados. Este dado alarmante do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) expõe a gravidade de uma violação sistemática de direitos humanos no Brasil.
No setor público, estruturas hierárquicas rígidas e o receio de represálias agravam o cenário, criando um ambiente propício à subnotificação e à perpetuação da violência. A ausência de canais eficazes para denúncia e a falta de políticas institucionais consolidadas evidenciam a urgência de mudanças estruturais.
Uma lei para transformar a realidade
A Lei nº 14.540/2023 surgiu como resposta a essa demanda por ambientes de trabalho mais seguros. O texto estabelece o Programa de Prevenção e Enfrentamento ao Assédio Sexual e demais Crimes contra a Dignidade Sexual na administração pública, abrangendo também instituições privadas prestadoras de serviços públicos.
O programa determina ações concretas: capacitação continuada de servidores, campanhas educativas permanentes e canais de denúncia protegidos. No entanto, em 2025, quando a lei completa dois anos, sua implementação ainda esbarra na resistência e na morosidade de gestores públicos.
Mudanças estruturais e proteção às vítimas
A legislação inova ao estabelecer um sistema integrado de prevenção e combate ao assédio. As instituições devem oferecer treinamentos regulares, manter canais acessíveis para denúncias e garantir proteção contra retaliações. O texto exige ainda a preservação de registros por cinco anos, permitindo o monitoramento contínuo e a avaliação da efetividade das medidas.
A capacitação dos agentes públicos emerge como elemento central. Os treinamentos abordam desde o reconhecimento de comportamentos abusivos até os procedimentos legais para denúncia e proteção. Paralelamente, campanhas educativas permanentes buscam romper o ciclo de silêncio e impunidade.
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Aprendizados internacionais
A experiência francesa demonstra a eficácia de plataformas digitais para denúncias anônimas e políticas preventivas obrigatórias. Na Suíça, a presença de ouvidores independentes fortalece a mediação de conflitos e o apoio às vítimas. Essas boas práticas, incorporadas à legislação brasileira, apontam caminhos para a transformação institucional.
O papel decisivo dos novos gestores
Com a posse dos novos prefeitos em janeiro de 2025, a implementação da Lei nº 14.540/2023 demanda prioridade. O momento exige liderança na criação de estruturas locais de prevenção e combate ao assédio, alinhadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, especialmente quanto à igualdade de gênero (ODS 5) e instituições eficazes (ODS 16).
Desafios e próximos passos
A efetividade da lei depende de ações concretas. É fundamental garantir:
- A realização sistemática de treinamentos
- O funcionamento ininterrupto de canais de denúncia
- A investigação célere e transparente dos casos reportados
- O monitoramento contínuo dos resultados
O envolvimento da sociedade civil no acompanhamento dessas ações torna-se essencial para cobrar resultados e aprimorar as políticas implementadas.
Conclusão
Romper com a cultura de violência sexual exige um esforço conjunto e contínuo. Os obstáculos vão além das estruturas institucionais: envolvem o enfrentamento de preconceitos arraigados e práticas que normalizam a violência de gênero. A transformação começa pela ação decisiva de gestores públicos. Cabe aos prefeitos que assumem em 2025 liderar a implementação dessas políticas, criando mecanismos efetivos de prevenção e resposta ao assédio sexual. É preciso garantir ambientes de trabalho seguros como condição de cidadania e dignidade humana.
AUTOR: VINICIUS MIGUEL