Ex-presidente recua diante de Alexandre de Moraes, admite mentiras e decepciona seguidores, revelando colapso de narrativa construída ao longo dos anos
Ainda não havia internet, mas os memes já ensaiavam os primeiros passos. Exemplo disso circulou nos recursos então disponíveis com a versão satírica do fado “Tiro liro liro”, da imortal Amália Rodrigues: “Portugal não entrou na guerra, mas também não acovardou-se / Cobriram Portugal com um pano e escreveram por cima Portugal mudou-se”. Tudo a ver com a histórica fuga da corte portuguesa para o Brasil, comandada por D. João VI.
Perdoem os patrícios, mas o blague me ocorre a título de ilustração da atitude do ex-presidente Jair Bolsonaro, que literalmente rasgou a fantasia de machão “Imorrível, incomível e imbroxável” e optou por acovardar-se, sem confrontar o ministro Alexandre de Moraes, do STF. Uma tentativa desesperada de salvar a própria pele e evitar, pelo menos por enquanto, a eventualidade de uma prisão preventiva..
Ao admitir, quase aos prantos, ter se acostumado a mentir rotineiramente para conquistar o eleitor, o ex-presidente pediu perdão ao ministro, para classificar seus seguidores mais fiéis como “malucos” e “pobres coitados”. Não poupou nem mesmo os que acamparam às portas dos quartéis ou enviaram milhões em Pix para assegurar sua boa vida. Sem contar que foi para as calendas a história de anistia para os condenados pelo 8 de janeiro.
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Está claro que cantar o hino nacional para pneus ou pedir ajuda aos ETs com celular na testa diz muito sobre a sanidade mental dos manifestantes. Mas o efeito imediato da atitude amesquinhada do fanfarrão assustado foi devastador, como até ele poderia imaginar. Isso pouco lhe importa, pois confia que tudo será rapidamente esquecido e a própria legião de “malucos” vai encontrar justificativa para sua atitude.
Quando nada, para argumentar que “o mito é assim mesmo” e “todo político faz isso”. Não faz! Pelo menos não assim tão descaradamente. O problema é que mesmo tamanho choque de realidade não é capaz de superar a vergonha de admitir o erro e o que se considera “humilhação” pela evidente derrota. Não se pode esquecer que o radicalismo destruiu antigas amizades e dividiu famílias, exemplos que podem ser contados aos milhões por todo o país.
Então não tem jeito mesmo! – pensarão alguns. Nada disso! É preciso agora o exercício do acolhimento dessa multidão de desgarrados. Não se pode reativar o ressentimento que foi cuidadosamente explorado na formação dessa legião de seguidores. Não se pode esquecer dos (muitos) oportunistas que se beneficiaram, elegendo-se na esteira de tudo aquilo pelo que Bolsonaro, humilhado, se penitenciou frente aquele que sempre considerou como seu perseguidor.
Não é, no entanto e por definitivo, momento de exploração vingativa dessa frustração pela covardia do líder. A evidente admissão de culpa de Bolsonaro no depoimento já é um açoite doloroso, castigo suficiente. É imperioso trabalhar agora pela superação dessa vergonhosa página da história política nacional.
